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A judicialização na era da inteligência artificial cotidiana

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A inteligência artificial já faz parte do nosso dia a dia. Aquele futuro que parecia distante e apenas enredo dos filmes de ficção científica está rapidamente envolvendo nossas atividades mais cotidianas. A capacidade de processamento de quantidade inimaginável de dados (big data) e a transformação dessas informações (imagens, textos, voz etc) em dados estruturados está criando um outro paradigma, que muitos chamam de nova revolução industrial.

A utilização de fórmulas matemáticas (algoritmos) combinadas com potentes soluções tecnológicas que simulam nossas redes neurais e aprendem conforme interagem com seus usuários (machine learning), inicialmente usadas para indicar propagandas e músicas, avançam rapidamente para dirigir carros, automatizar tarefas administrativas, analisar padrões, predizer situações e interagir coisas (IoT) com nossas atividades diárias, entre uma infinidade de aplicações. São muitos benefícios que vão nos permitir utilizar nosso tempo de forma qualitativa, pois vão resolver problemas rotineiros e, ainda, auxiliar os médicos na definição do melhor diagnóstico ou os juristas a compilar dados relevantes de milhares de processos e assuntos para uma melhor e mais rápida solução dos casos em andamento. E essas novidades estão cada vez mais acessíveis às pessoas comuns e aos profissionais de múltiplas áreas do conhecimento.

Mas, tais benefícios também trazem problemas, como a falta de privacidade pela necessidade de obtenção de informações e preferências, ou seja, a busca frenética por dados (data mining) – os verdadeiros combustíveis dessa dinâmica. Também pode-se mencionar as novas modalidades de crimes cibernéticos, a configuração de fórmulas que replicam preconceitos em ferramentas de seleção de novos funcionários e as bolhas de pensamento pela indicação de notícias apenas conforme nosso histórico de escolhas e que limitam, de certa forma, a diversidade de ideias. Essas situações – e outras que surgem a cada nova aplicação – precisam das correções naturais de qualquer processo de mudança.

Por um lado, não há como ir contra esse caminho sem volta e precisamos aprender a utilizar essas ferramentas a nosso favor, cientes de que a inteligência é artificial, e o ser humano, o verdadeiro autor desse fenômeno. Por outro, precisamos antecipar esses problemas, promover o diálogo e colocar rapidamente na agenda de discussões os impactos negativos e os ajustes necessários, para evitar consequências de grande alcance, pela própria natureza da internet.

Pelo aspecto legal, não basta o Marco Civil da Internet, que indiscutivelmente trouxe muitos avanços. É preciso instituir no país uma lei de proteção de dados moderna e adequada a esses desafios, como os dois projetos tramitando sobre a matéria, o PL 5276/16, na Câmara dos Deputados, e o PLS 330/13, do Senado, que seguem em grande parte as tendências da última atualização da legislação Europeia sobre o tema, e são capazes de balizar esse diploma legal de extrema importância para regular a coleta, o tratamento e a transferência de dados pessoais.

No Brasil, muitos serviços online e aplicativos guardam dados de localização o tempo todo, sem consentimento ou legítimo interesse justificado, acessam por onde navegamos sem qualquer restrição e transferem esses dados para terceiros que não gostaríamos, pois inexistem regras específicas para essas atividades, como na hipótese do usuário que escolhe um app de corrida e, sem aviso, tem seus dados repassados para planos de seguro de vida.

Há também algumas financeiras baseadas em tecnologia, que têm recusado financiamentos com base em informações pessoais abertas na rede (credit score) que em alguns cenários diferem da realidade do cliente, e isso tem gerado problemas judiciais cada vez mais noticiados pela imprensa e pelo próprio judiciário. Mais recentemente assistimos à transferência de dados entre Whatsapp e Facebook criticada em diversos países e os cada vez mais comuns vazamentos de dados pessoais. São muitos os problemas relatados e as demandas judiciais começam a crescer na mesma proporção das novas tecnologias.

Em outra vertente, empresas preocupadas em preservar seus usuários, especialmente as multinacionais que seguem as leis vigentes na Europa e nos Estados Unidos, têm aberto portais de transparência como grandes diferenciais competitivos. Elas visam minimizar essa crescente judicialização em ambientes que permitem com muito sucesso o relacionamento direto e simplificado para ciência e correção de dados armazenados ou para que se escolha utilizar ou não certas funcionalidades.

A conjugação de várias frentes de atuação que permitirá alcançar o melhor caminho, assim como a troca de ideias e soluções, pois os problemas e objetivos são comuns e vêm sendo cada vez mais discutidos em todo o planeta. Ao instituir instrumentos regulatórios eficazes e trazer essa problemática para a mesa de inovação, todos ganham e certamente serão evitados muitos conflitos. E a sociedade, que está vivenciando na pele e em seus equipamentos essa profunda e acelerada transformação, tem papel de grande importância para entender e participar cada vez mais dessas reflexões, incentivando as empresas e as autoridades públicas a adotar uma postura ativa e constante para antecipar soluções e garantir seus direitos fundamentais na interação com as novas tecnologias, nessas novas dinâmicas sociais.


Por Alexandre Zavaglia Coelho, professor e diretor executivo do Instituto de Direito Público de São Paulo e um dos coordenadores da série de livros Direito, Inovação e Tecnologia.

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