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Evolução da criatividade – da teoria para a prática

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Imagem: Pixabay
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O presente trabalho apresentará a relevância do construto da criatividade para a evolução do processo de inovação. No contexto hiper conectado e competitivo atual, os processos de inovação têm sido cada vez mais compreendidos como fonte de vantagem competitiva no mercado. Para que um eficiente processo de inovação seja criado, um de seus pilares (a criatividade) precisa ser constantemente impulsionado pela instituição e suas lideranças.

Por se tratar de uma habilidade intrínseca ao ser humano, a criatividade pode ser desenvolvida em todos os agentes em maior ou menor grau de necessidade, conforme será apresentado neste trabalho.

No entanto, apesar de os objetivos comuns dos processos de inovação e criatividade, o estudo indica que o gerenciamento destes institutos deve ser realizado de forma paralela e interligada. Inovações se relacionam a processos e a criatividade aos agentes que desenvolvem esses processos. Portanto, por se tratar de um construto complexo e com necessidade de gerenciamento de diversas variáveis humanas, os processos de desenvolvimento da criatividade merecem alto investimento, atenção e acompanhamento constante.

O trabalho abordará três conceitos principais de criatividade que se contextualizam em diferentes períodos da história. Contará com a visão de Torrance sobre a criatividade, sendo complementado por Tereza Amabile e trabalhado, mais atualmente, na teoria de Glaveanu sobre a psicologia cultural da criatividade.

O estudo também compreenderá ferramentas efetivas para o desenvolvimento da criatividade em sua potencialidade, como estreitar as conexões humanas por meio da liderança com propósito e o uso de humor para amenizar impactos emocionais negativos.

A multidisciplinaridade do tema permitiu com que estudiosos da psicanálise, filosofia e sociologia apresentassem grandes contribuições ao estudo do construto, ampliando os canais de observação de uma habilidade altamente complexa.

A metodologia utilizada para o desenvolver deste material será a pesquisa bibliográfica que busca conceituar os institutos da criatividade e destacá-los como parte relevante do processo de inovação.

Criatividade e inovação: Construtos interligados de gestão diversa

A criatividade foi objeto de estudo durante toda a existência humana. Inventar ou inovar em algo sempre atraiu a curiosidade de filósofos, psicólogos e estudiosos de outras áreas. Com a Revolução Industrial e as linhas de produção recém-criadas, homens também precisaram se adaptar ao novo contexto a fim de manter sua sobrevivência. Grandes mudanças de paradigma necessitam de impulsionamento evolutivo humano.

Ellis Paul Torrance foi um psicólogo americano precursor no estudo da criatividade e seus motivadores. Por meio de estudos quantitativos e qualitativos, considerando suas pesquisas longitudinais, de acordo com (Neves-Pereira & Fleith, 2020), o psicólogo fez a distinção inicial de quatro medidas de pensamento criativo, denominadas forças criativas, sendo elas: aptidão para produzir grande número de ideias, flexibilidade para produzir respostas de diversos domínios, originalidade e capacidade de desenvolver, ampliar e implantar ideias.

Ainda de acordo com (Neves-Pereira & Fleith, 2020), o fato dos testes de Torrance avaliarem apenas medidas relacionadas ao pensamento divergente, fez com que o autor passasse a mostrar desinteresse pelo método elaborado.

Em evolução à teoria de Torrance, Tereza Amabile elaborou o modelo componencial de criatividade que, de acordo com (Neves-Pereira & Fleith, 2020), iniciou a análise dos fatores sociais e da motivação no processo criativo.

Tereza Amabile defende que o modelo componencial de criatividade é aplicável a qualquer domínio ou área de conhecimento, garantindo à sua teoria alta aplicabilidade prática. Por esse motivo, suas teorias embasam modelos de gestão de criatividade até a atualidade. O estudo de Amabile é composto pela análise de três conceitos intra individuais como: habilidades de domínio, processos criativos relevantes e motivação, além de um componente extra: o ambiente.

Não obstante às métricas desenvolvidas pelos pesquisadores, nos anos 2000 foi suscitado um novo domínio a ser analisado com as demais variáveis da criatividade até então. As emoções. De acordo com (Nakano, 2018), as emoções poderiam ser catalisadas e analisadas por meio de testes de inteligência emocional e lista de verificação de traços emocionais.

Conforme estudo de (Silva et al., 2022), atividades criativas envolvem um processo emocional e intuitivo. Nesse sentido, as emoções e sentimentos possuem funções que permitem identificar e redefinir de forma mais rápida e fácil as tarefas de projeto, o reforço de preferências e aceleração na formação de novas estruturas preferenciais. As emoções estão diretamente ligadas à motivação do agente e podem influenciar os demais integrantes de um grupo criativo.

A teoria mais utilizada atualmente para analisar a criatividade foi elaborada por Vlad Petre Glaveanu, Alex Gillespie e Jean Valsiner, sendo denominada como psicologia cultural da criatividade, embasados em pesquisas de Freud, Mead, Vygotsky, dentre outros estudiosos pragmáticos. Nesta vertente, de acordo com (Neves-Pereira & Fleith, 2020), a definição de criatividade concentra a atenção nos produtos criativos e em suas qualidades, impedindo a redução dos resultados à números estáticos.

As maiores contribuições desta teoria ao modelo de pesquisa da criatividade foram a inclusão da cultura como potencializador dos resultados criativos, a transição do foco dos produtos para os processos, transição do foco do indivíduo para as relações e a transição de avaliações universais da criatividade para as contextuais.

Nota-se, portanto, a alteração de um parâmetro individual na análise da criatividade para um padrão social em que a solução criativa está intimamente ligada à sua utilidade contextual e será construída com a participação de mais de um agente criativo.

Dada a evolução e a complexidade percebida no estudo da criatividade, consolidando-a como um processo colaborativo e passível de desenvolvimento, as instituições têm dado relevância ao tema por ser uma habilidade impactante no processo de inovação. Novas ideias de serviços e produtos têm sido consideradas agregadoras de valor para as companhias e tratadas como diferencial competitivo.

No referencial teórico do estudo de (Paz e Silva et al., 2022), os autores indicam que a criatividade existe independente da inovação. No entanto, a inovação precisa da criatividade para ser colocada em prática.

Um estudo mais antigo de (Gabriela Fabbro Spadari & Tatiana, 2015) realizou um levantamento a fim de localizar as temáticas e construtos mais avaliados em conjunto com a criatividade. Em artigos que abordavam a temática, 22,5% (vinte e dois e meio por cento) relacionaram a criatividade ao construto da inovação, sendo este listado em primeiro lugar.

Em tempos velozes, uma quantidade alta de ideias criativas são necessárias para atender a demanda do mercado, por isso, instituições têm investido na gestão da criatividade em conjunto com a gestão de inovação. Acelerada por uma crise sanitária mundial, a sociedade envidou todos os esforços para a construção de tecnologias disruptivas que pudessem substituir, temporariamente, o convívio humano.

Neste contexto, os reflexos de uma intensa disrupção tecnológica puderam ser sentidos nos âmbitos sociológico, antropológico e psicanalítico e, hoje, passam a ser objeto de estudos científicos. Assim como a tecnologia, o conhecimento sobre as faculdades humanas e suas potencializações precisam atingir o mesmo nível qualitativo evolutivo para compreendermos as características daquilo que o humano é capaz de criar.

Atualmente é possível perceber a proximidade entre os conceitos de criatividade, inovação e originalidade que, de acordo com (Neves-Pereira & Fleith, 2020), significa a celebração de todas as práticas humanas que dão origem a novos resultados, considerando menos aquelas que são mais convencionais ou não originais.

No entanto, mesmo estando a criatividade e a inovação conectadas por vários elos de objetivos convergentes, uma maior atenção tem sido requerida aos motivadores intrínsecos da criatividade, que são aqueles experimentados internamente pelo agente criativo. Essa maior compreensão pessoal sobre emoções e motivações, após a pandemia do coronavírus, reflete em uma maior autonomia do agente criativo na escolha de instituições para as quais trabalhar. Não apenas relacionado à autonomia do agente criativo estão suas emoções. A qualidade dos produtos produzidos por este também são impactados por emoções pessoais.

Um fator determinante que pode impulsionar os agentes criativos de uma equipe é o líder. Como apresenta o estudo de (Lopes Figueredo et al., 2022), a liderança desempenha um papel fundamental na constância e impulsionamento da motivação da equipe e por isso, também precisa ser criativa.

Algumas ferramentas podem ser úteis aos líderes que necessitam não apenas motivar a terceiros, como também manter a si próprios motivados e, em muitos casos, em ambientes nos quais há grande exposição a pressões externas. Conexões humanas e humor podem auxiliar a tornar o ambiente corporativo colaborativo e atenuar os efeitos das emoções negativas no processo criativo.

Os líderes voltados para o propósito tendem a impactar suas equipes de forma positiva, conforme pontua o estudo de (Gomes et al., 2020). Esse tipo de liderança estabelece relações humanas substanciais com sua equipe uma vez que os seus valores pessoais se confundem com os profissionais.

Uma liderança para o propósito eficiente também deve conectar esses valores à prática de sua atuação, permitindo a horizontalidade de suas relações e impactando no pertencimento dos demais membros da comunidade no processo criativo. Dessa forma, os propósitos e valores são transmitidos com profundidade capazes de amenizar efeitos de emoções negativas pontuais.

Nota-se neste tipo de liderança um alto valor humano que prioriza as conexões com o intuito de democratizar as tomadas de decisões, empregando um maior comprometimento da equipe com o resultado e com os envolvidos.

Neste cenário, a utilização de mecanismos humorísticos têm o condão de aperfeiçoar as relações interpessoais por trabalharem o desenvolvimento da percepção de si e do outro em um dado contexto. Os impactos do humor no cérebro, conforme pesquisa apresentada por (Lage, 2022), estimulam células responsáveis pelo reconhecimento da intenção em terceiros, bem como na maneira como o próprio agente lida com suas emoções.

Sendo o humor uma forma de narrativa jocosa e baseada em percepções fantasiosas de si e de terceiros, traz ao contexto corporativo formas inovadoras de análise de uma situação. O estudo de (Lage, 2022) apresenta uma pesquisa realizada com um grupo de pessoas que precisaram escrever as suas próprias piadas. O resultado apresentou que as pessoas com a classificação mais alta no quesito produção de piadas eram aquelas que mais estavam em contato com a linguagem humorística.

O humor não apenas se mostra como propulsor criativo, como também se manifesta como experiência em diversas etapas do processo criativo a depender de como é utilizado pela liderança e time. O humor afiliativo e auto-aperfeiçoador descritos na tese de doutorado de (Pereira, 2020), são capazes de aumentar o potencial criativo por estarem ligados a aspectos humanos internos como: alegria, autoestima, extroversão e intimidade.

Já os tipos de humor dimensionados como agressivo, que utiliza-se de sarcasmo ou situações absurdas, bem como autodestrutivo, que coloca o agente em posição jocosa, precisam de mais atenção ao serem manejados, considerando que podem conflitar com as percepções do receptor da mensagem.

Considerando a relevância e complexidade dos aspectos ligados à criatividade, bem como maneiras eficientes de tratá-la institucionalmente a fim de agregarem valor ao produto final da companhia que pode ser, em última instância, traduzido pela vantagem competitiva desta no mercado, conclui-se que a criatividade é um ponto a ser considerado prioritário nas instituições a fim de garantir a perenidade desta no mercado.

Por estes motivos, o gerenciamento da criatividade deve estar intimamente ligado ao gerenciamento da inovação. No entanto, por demandar aspectos sensíveis no seu desenvolvimento, como emoções humanas, devem ser avaliados de forma apartada e cautelosa.

Investimentos em pesquisa e desenvolvimento relacionados à inovação, especialmente, voltados para tecnologias disruptivas, têm sido cada vez mais comuns nas grandes corporações. Em crescimento proporcional devem ser aplicados investimentos também no potencial humano que dá origem a estas ferramentas. Emoções estão comprovadamente ligadas ao processo criativo e precisam de políticas efetivas de tratamento com a finalidade de serem melhor gerenciadas.

Considerações Finais

O presente estudo avaliou a evolução histórica da criatividade, apresentando referenciais teóricos sobre o tema e como o aspecto pode ser trabalhado de forma corporativa com a finalidade de intensificar o processo da inovação cada vez mais necessário no contexto competitivo atual.

A evolução no estudo da criatividade permitiu o desenvolvimento de ferramentas específicas para o desenvolvimento dessa habilidade no contexto corporativo, considerando todas as suas variáveis humanas.

O trabalho apresentou a liderança com propósito, conexões humanas e humor como alguns dos instrumentos utilizados com a finalidade de potencializar a habilidade criativa em um time voltado para a inovação.

Em um contexto mundial hiperconectado com mais investimentos em pesquisa e desenvolvimento, não apenas a tecnologia carece de apoio. Os agentes criativos e sua complexidade devem ser objeto de estudo e prioridade nas grandes empresas.

Referências Bibliográficas

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Fernanda Tannous é associada à AB2L, Advogada formada pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo, especialista em Gestão Legal pela Escola Paulista de Direito e Mestranda em Desenvolvimento de Negócios e Inovação pela MUST University.
Controller jurídico há mais de 10 anos e CEO da TL Adsumus Gestão Jurídica, empresa especializada em Controladoria Jurídica e Legal Operations.

Fernanda Tannous
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