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Tecnologia NFT apresenta possiblidades ilimitadas no combate a fraudes e falsificações

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Fronteira Fisico digital
Fronteira Físico/Digital”, primeira obra brasileira com a tecnologia NFT a ser leiloada no país em reprodução original. Crédito: assessoria do artista Bel Borba

Em junho deste ano, será realizado o primeiro leilão brasileiro de arte em non-fungible token (NFT — em tradução simples, token não-fungível). De autoria do artista plástico baiano Bel Borba, a obra “Fronteira Físico/Digital” a ser leiloada, será recortada em cem partes e cada pedaço da obra terá lance mínimo de US$ 600. Pode soar estranho, mas é exatamente isso. A tela será fragmentada em cem partes tanto no ambiente virtual e recortada no meio físico. Isso permitirá o comprador receber o pedaço digital em uma carteira de criptomoedas e o pedaço físico via endereço com um QR Code de referência de titularidade. A plataforma InspireIP realizará a façanha.

Pintada exclusivamente para o evento e com lance mínimo de US$ 600 por pedaço, a obra sugere uma verdadeira colcha de retalhos que transcende a barreira digital. Segundo o autor, “arte é compartilhamento” e a tecnologia NFT permitirá que cada comprador seja sócio, virtual e físico, de um todo da obra através do fragmento que irá adquirir. Considerando o acontecimento inédito, neste breve texto, buscamos destrinchar a relação entre a preservação do direito autoral e a nova tecnologia, que promete revolucionar o modelo de negócios do direito autoral: o NFT, sigla para “Non-fungible Token”.

Em uma simples explicação, o NFT é nada mais do que um certificado digital de autenticidade. Ele serve para garantir a originalidade — na mesma linha do reconhecimento de firma por autenticidade, só que online, mais potente, mais seguro e à prova de fraudes. Contudo, antes que o leitor se pergunte por qual motivo um novo tipo de “certificado digital” viraria tema para mais um artigo, explicaremos a sua importância para o direito autoral.

Quando pensamos em documento, normalmente, o que nos vem primeiro à cabeça é o suporte físico, o papel e, por consequência, tendemos a deslegitimar o documento virtual por acreditar que não teria a mesma validade ou importância. Contudo, a partir do século XX, a maior inserção da tecnologia e da internet nos costumes diários fez com que fosse agregada maior fluidez ao nosso estilo de vida e, consequentemente, os conceitos de documento e segurança também sofressem alteração. Como consequência, foram necessários instrumentos que se adaptassem às circunstâncias do contexto. E, naturalmente, a pandemia acelerou o processo.

O documento digital possui uma natureza mais dinâmica e interativa e, diante do desenvolvimento de outros tipos de suportes informacionais, é mais flexível e adaptável. Contudo, apesar de sua incorporeidade, não se deve limitá-lo, pois assim como um documento estático, ele também é dotado de estabilidade para ser considerado como registro de informação infungível.

Em termos de lei, o art. 7º da Lei 9.610/98 define a natureza de bens tangíveis, intangíveis, fungíveis e não fungíveis. Já o Código Civil especifica que bem fungíveis são bens substituíveis por outros de mesma espécie, qualidade e quantidade e os infungíveis, por sua vez, são únicos e insubstituíveis. A título ilustrativo, uma simples nota de R$ 10,00 é algo tangível e fungível. Pode ser tocada e facilmente substituída por qualquer outra. Agora, uma obra digital criada pelo renomado artista Bel Borba, não. É algo único, de impossível reprodução e certamente intangível e não fungível. Uma reprodução não autorizada retira a autenticidade e faz com que a ilustração perca valor.

O NFT, se atrelado à obra de Borba, torna-se um bem exclusivo, singular, “feito sob medida”, e confere à obra um selo de autenticidade digital, confirmando sua autoria e a noção digital de propriedade. O NTF é um contrato inteligente (smart contract) que confirma que tal produto é autêntico e não somente feito de códigos, o que certamente será uma ferramenta muito útil para confirmar a confiabilidade de registros na comercialização digital.

Em termos de certificação, o NFT tem sua infraestrutura derivada do blockchain, tecnologia descentralizadora que a todo momento valida as informações e confere autenticidade a uma operação ou documento, como uma espécie de cartório digital à prova de violação, porém livre de supervisão governamental ou privada, sendo controlado por uma rede de computadores e podendo ser acessado por qualquer pessoa na rede, mas não alterado ou excluído.

O conceito por trás do NFT não confere autenticidade somente a imagens, de modo que qualquer mídia digital pode ser transformada em um bem não-fungível. Arquivos de áudio, mensagens, vídeos, como por exemplo um vídeo do jogador de basquete Lebron James, comprado por 208 mil dólares, ou o primeiro tweet do CEO do Twitter, Jack Dorsey, vendido por quase 3 milhões de dólares e comparado com o quadro da Monalisa.

Então vale a pergunta: por que alguém compraria um gif, vídeo ou imagem se está gratuitamente disponível na internet para uso imediato e download?

Sabemos que versões originais despertam interesse e a questão também não gira em torno somente da confiabilidade. A sociedade sempre foi obcecada pela ideia do original. Antes da pandemia, por exemplo, o Museu de Louvre registrava mais de 10 milhões de visitantes que competiam entre si para ver a Monalisa, obra prima de Leonardo da Vinci. Ou seja, ter acesso a versões originais ou exclusivas não só é um desejo do espírito humano, como também alimenta a cultura, que desde os primórdios tem verdadeiro fascínio em ter algo único ou raro.

Portanto, quando o criador e detentor do direito autoral atrela sua obra digital a um NFT, ele atesta que a reprodução é uma cópia “original”, o que facilita até mesmo a prevenção e o rastreamento de uso não autorizado de obras. Mesmo com a facilidade do “CTRL+C” e “CTRL+V”, do printscreen ou até mesmo da “foto da foto”, o NFT cria uma escassez no item. Mesmo que existam reproduções não autorizadas ou semelhantes, apenas uma tem a certificação de autenticidade dada pelo autor da obra. Ela é legitimamente única.

Há ainda outras funcionalidades interessantes no selo NFT. O autor pode programar, via smart contract, royalties em uma obra para que a sua distribuição ocorra de forma automática, possibilitando o recebimento de uma criptomoeda sem qualquer limitação física ou cambial. Com o rastreamento, Borba vai receber uma porcentagem do valor toda vez que uma das cem partes leiloadas de sua obra for vendida novamente.

Com tantos elogios ao NFT e a possibilidade de se criar uma versão tão preciosa a partir de uma mídia digital, é natural questionar se há algum conflito entre o selo e o direito autoral. Os autores podem ficar aliviados, porque não há qualquer conflito entre os institutos. Assim como qualquer venda de obras materiais dotadas de direitos autorais, o NFT não concede a propriedade intelectual ao detentor. Ainda que seja necessário criar regras claras sobre o tema, a titularidade do original não muda.

Como se sabe, no Brasil, diferente daquilo que se pratica nos Estados Unidos, por exemplo, não se pode renunciar a titularidade de uma obra. Dito de outra forma, a venda de uma obra dotada de direitos autorais no Brasil fica condicionada à divisão entre o direito moral do autor, que é indisponível, personalíssimo, inalienável e irrenunciável e o direito patrimonial, que pode ser negociado de maneira expressa, presumidamente onerosa, por meio de licença, cessão ou concessão. Dessa forma, no território brasileiro, independente de quem seja o proprietário da obra, o direito à autoria e à integridade da obra serão eternamente de quem a criou.

Sendo assim, tudo que o NFT faz é “linkar” a reprodução à obra, por meio da venda controlada de cópias digitais de suas obras, mostrando quem é o dono verdadeiro, mas com uma assinatura digital do autor, com regras pré-programadas pelo criador.

A transformação em NFT das obras de arte permite a criação de uma nova dimensão em torno da autenticidade. Prevê a reprodução autorizada de mídias digitais de forma organizada, autêntica e legal, possibilitando ainda uma remuneração adequada ao criador. São as novas tecnologias criando tendências, novos hábitos de consumo e formas diferentes de pensar um negócio, mas, acima de tudo, permitindo possiblidades ilimitadas no combate às fraudes, falsificações e violações de direitos autorais.

Surgido em 2012, o NFT não é exatamente uma tecnologia nova. Porém, mesmo com mais de oito anos de existência, a matéria ainda não foi regulamentada no Brasil. O que há são alguns projetos de lei, como o PL 2060/2019 sobre criptoativos, mas nada concreto e específico para a nova tecnologia. Apesar de terem características semelhantes às criptomoedas, notadamente a criptografia e o blockchain, os NFTs não podem ser comparados. Isso porque, mesmo que ambas derivem de uma rede criptografada e descentralizada, as criptomoedas são moedas digitais, enquanto NFTs são exclusivamente certificados digitais.

Estes autores tiveram a oportunidade de conversar com Bel Borba. O artista revela que já possui “outros projetos engatilhados” envolvendo os NFTs, podendo ser “esculturas criadas com técnica de realidade virtual que só existirão nessa dimensão, nascerá virtual/digital e assim continuará“. Ao usar a inovação tecnológica para fomentar seu trabalho, ele acredita que o NFT é “ideal para assegurar a correta distribuição de royalties no universo digital, uma vez que garante que o autor original sempre receba uma porcentagem com a revenda.”

Em que suas virtudes, a nova tecnologia carece de atenção especial do legislador para ser mais protetiva aos artistas. Ainda que a falta de regulamentação e da descentralização promovida pela ausência de intermediação pública facilitem muito as negociações envolvendo NFTs, tal liberdade também os torna mais suscetíveis a fraudes, como vem ocorrendo principalmente em relação às fraudes de arte em blockchain, uma vez que qualquer pessoa pode anunciar uma obra ou mídia nas plataformas de venda e leilão de NFTs, independentemente de sua relação com a obra, o que permite a falsificação. Além disso, assim como no mundo analógico, não há como garantir a sua autenticidade.

Mesmo com a carência de regulamentação, chama a atenção o fato de que a Receita Federal do Brasil passou a incluir códigos específicos para a declaração de ativos digitais na declaração de Imposto de Renda para pessoas físicas de 2021, o que inclui NFTs. Portanto, é extremamente importante que os consumidores se atentem ao que realmente significa essa nova tecnologia e o que a sua propriedade representa, tanto em questão de ativos financeiros, quanto em questão de direitos autorais.

Texto original de Daniel Becker, Nicole Latorraca e Paulo Samico, publicado pelo portal Jota

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