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Por que as mulheres estão deixando os escritórios de advocacia?

No recorte de gênero, a diversidade vem se revelando um desafio para o mercado jurídico, em especial para os escritórios de advocacia.
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Por Opicebum

Em todos os setores da economia, o pilar social do ESG – Environmental, Social and Governance, focado nas questões de diversidade e inclusão, está na pauta das grandes Organizações, que trabalham em uma série de compromissos, metas e indicadores para acompanhar os avanços sobre o tema.

O movimento global vem dando sinais claros que seguirá firme nesse sentido. Exemplo relevante vem do mercado de capitais, quando a SEC – Securities and Exchange Commission aprovou a proposta apresentada pela Nasdaq para impor às empresas listadas naquela bolsa a divulgação de informações sobre diversidade em seus conselhos de administração. Na mesma linha, a CVM – Comissão de Valores Mobiliários aprovou normativa para a divulgação de informações sobre gênero e diferenças de remuneração, entre outros critérios de diversidade, nos quadros das companhias abertas no Brasil.

O modelo está sendo chamado de “pratique ou explique”, cuja premissa não é impor às empresas adesão obrigatória por meio de regulação, mas estimulá-las a adotar recomendações referentes à governança corporativa. Com isso, as companhias podem explicar o que ainda não conseguem praticar.

Sob a perspectiva de negócios, os resultados positivos já são mensuráveis e apontam que empresas com programas consolidados de diversidade e inclusão aumentam seus ganhos financeiros, alavancam sua reputação e melhoram performance em inovação e transparência. Está claro, portanto, que diversidade representa melhor resultado.

Porém, no recorte de gênero, a diversidade vem se revelando um desafio para o mercado jurídico, em especial para os escritórios de advocacia. Abordaremos algumas pesquisas nesse artigo que demonstrarão isso.

No Brasil, mercado que representa cerca de 150 bilhões de reais por ano, as mulheres advogadas estão nas bases das bancas e na condução de determinadas práticas jurídicas, porém distantes ainda dos cargos de alta liderança. Em pesquisa de 2021, realizada pelo Anuário Análise Advocacia e contemplando 192 escritórios do país, conclui-se que 80% das bancas contam com mulheres à frente de áreas estratégicas, mas apenas 36% possuem mulheres ocupando a posição de CEOs ou Sócia-Presidente.

Nos EUA, mercado mais relevante do mundo com estimativa de 127 bilhões de dólares por ano (considerando apenas a receita dos 100 maiores escritórios), pesquisa da American Bar Association apontou que pelo sexto ano consecutivo, as mulheres superaram os homens em números de estudantes nas salas de aula das faculdades de direito.

Embora esses números sejam promissores, foi detectada uma preocupante tendência no mercado norte-americano: as mulheres advogadas estão deixando os grandes escritórios de advocacia.

Essa foi a conclusão da consultoria de inteligência jurídica Leopard Solutions, quando ao trabalhar no fechamento de seus relatórios sobre contratações e desligamentos no setor da advocacia no ano passado, percebeu que um expressivo número de mulheres deixou suas posições em grandes escritórios de advocacia – as chamadas “Big Law Firms” – no ano anterior.

Durante a análise dos desligamentos dos 200 maiores escritórios de advocacia norte-americanos, comparando os anos de 2021 e 2022, a consultoria percebeu que cerca de 2.500 mulheres haviam deixado suas posições. Mas curiosamente, a consultoria não conseguiu interpretar a partir dos dados coletados qual era o destino desses profissionais, já que elas não reingressaram nos mais de 4.000 escritórios ou 8.000 empresas que a consultoria acompanha.

A Leopard resolveu então debruçar-se sobre esse mistério, dedicando-se a pesquisar especificamente essas mulheres advogadas que saíram das Big Law Firms para entender o que as motivou a tomar a decisão de desligamento. Incentivaram também que essas mulheres escrevessem comentários sobre suas próprias experiências.

As preocupações com a maternidade ou constituir uma família não foram as molas propulsoras das escolhas dessas mulheres. A maioria delas – cerca de 70% – responderam que o fato de ser mãe e ficar com os filhos tinha pouco ou nada a ver com a decisão de deixar suas posições como advogadas.

A pesquisa revelou que um dos pontos cruciais da decisão foi a falta de apoio e oportunidades de crescimento em seus escritórios de advocacia. Mais de 70% responderam que se sentiam excluídas das oportunidades de progressão de carreira. Ainda, a pesquisa concluiu que no início de suas carreiras, mais da metade das mulheres desejavam se tornar sócias dos escritórios de advocacia, mas no meio dessa jornada, percebiam que mesmo fazendo sólidas entregas, não teriam oportunidades de ocupar posições mais altas.

Para nós – mulheres que ocupam espaços de liderança nesse mercado – o grande insight dessas pesquisas é que a cultura dos escritórios de advocacia está afastando as mulheres advogadas. Não é a falta de acesso ao ensino superior, não são os filhos, a família ou a jornada de trabalho.

Os escritórios de advocacia brasileiros precisarão de uma estrutura de governança mais robusta para endereçar essa questão. Para além da atratividade e retenção de talentos, os escritórios não conseguirão atender as demandas dos clientes que praticam abordagens mais maduras sobre o tema, como a exigência de divulgação de dados a respeito de seus programas de diversidade e a adoção de parâmetros dessa natureza como critério para escolha dos fornecedores. Invariavelmente, a falta de ação resultará em perda de receita.

Vale mencionar que a pesquisa da Leopard Solutions também apresenta propostas de melhoria colhidas a partir das experiências reais de algumas mulheres que exercem funções de liderança em grandes escritórios de advocacia nos EUA.

Fazendo uma leitura voltada para o mercado brasileiro, acreditamos que as estratégias de melhoria mais significativas consistem em: 1. Propiciar para as mulheres advogadas oportunidades de crescimento, dando a elas espaço na exposição para os clientes e reconhecendo seu sucesso; 2. Capacitar as lideranças para que vieses de gênero não afetem processos de progressões de carreira; 3. Dar para as mulheres um assento à mesa, para que elas possam tomar decisões-chave que levem em conta perspectivas sobre como todas as advogadas do time serão afetadas por tais deliberações.

Esses diálogos corporativos se tornaram necessários para a perenidade dos escritórios de advocacia no Brasil. Sigamos em frente.

*Camilla Jimene, sócia e CEO do Opice Blum, Bruno e Vainzof Advogados. Líder da área de Contencioso Digital do escritório.

*Danielle Serafino, sócia do Opice Blum, Bruno e Vainzof Advogados. Líder das áreas de Legal Innovation, Legal Design, Startups e Tributário Digital do escritório.

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