A AB2L iniciou suas atividades em 2017 e, desde então, escreve os capítulos de uma história que tem muito para contar sobre o ecossistema de tecnologia jurídica.
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Texto original de Daniel Becker, Keila Farias Mota, Paulo Samico e Paulo Silva, publicado pelo Jota
Há quase dois anos, o mundo começou a experimentar os efeitos trágicos de uma pandemia sem precedentes na história recente. Com o objetivo de preservar vidas, inúmeras autoridades públicas refizeram as contas para suportar os mais necessitados. Na iniciativa privada, não foi diferente. Apontadas como as que mais geram empregos formais de carteira assinada no país, as pequenas e médias empresas foram as mais afetadas com a crise. Dados do Caged, todavia, demonstram recuperação rápida, e o Brasil contabiliza, em 2021, a geração de mais de 2,1 milhões de empregos. E as grandes empresas?
Sistemas de governança robustos, aprovação do conselho diretor, prévia autorização de controladores fazem com que as grandes empresas não sejam tão ágeis quanto poderiam nas tomadas de decisões. Ainda assim, dados do Ministério da Economia reforçam que as corporações também apresentam saldo positivo em termos de contratação. Poderia ser melhor? Uma estratégia jurídico-financeira bem desenhada ajudaria a superar os desafios propostos nestes cenários de instabilidade e melhorar estes números?
Seja na construção ou na execução da estratégia corporativa, os departamentos jurídicos precisam estar conectados com a área financeira. Já não basta “cumprir o orçamento”. Para deixar de ser visto como custo e sim como investimento, os advogados internos precisam observar atentamente as oportunidades de gerar valor financeiro.
São alguns exemplos a revisão do provisionamento, a constante gestão dos contratos com os escritórios e o alinhamento das metas orçamentárias corporativas com os objetivos internos. A eficiência, entendida aqui como aquilo que se relaciona à construção e realização do orçamento de forma responsável, é uma virtude do departamento que consegue construir seus custos baseado em premissas sólidas e demonstráveis. Logo, executar o orçamento para o ano-calendário proposto é cumpri-lo exatamente nos termos acordados com a administração.
O que se ignora, muitas vezes, é o aspecto da eficácia quanto à execução do orçamento, entendido aqui como os resultados obtidos nesta execução. Não se trata de gastar o orçado ou menos que o orçado, mas sim, quais resultados este gasto propiciou. E, aqui, pode-se dizer que a área de Legal Operations (LegalOps) se torna essencial ao jurídico. Se tal área já se faz necessária quando abordamos o aspecto da eficiência (estrutura e cumprimento do orçamento), maior é sua necessidade quanto tratamos do aspecto da eficácia, que tem relação direta com a estratégia da organização, uma vez que esta vincula-se diretamente com os resultados.
Sob esta perspectiva, cabe à área de LegalOps garantir a visibilidade, o cumprimento e a aderência dos gastos a metas estratégicas do jurídico e da empresa, de modo que os gastos sejam realizados da maneira que mais se adeque a tais metas.
A título de exemplificação, pode-se citar uma empresa que tenha por objetivo melhorar seus níveis de satisfação junto a seus clientes. Como estratégia adotada, ela pode privilegiar as soluções de conflito extrajudiciais. Neste exemplo, a área de Legal Operations não apenas cuidaria do orçamento garantindo que os valores estão aderentes ao orçado e a respectiva política de acordos, mas, afiançando, igualmente, que a estratégia de privilegiar canais extrajudiciais está sendo cumprida.
Como sabemos que nem todas as empresas possuem uma área de Legal Operations ou de Controladoria Jurídica e, mesmo que contem, possuem diferentes estágios de maturidade, reunimos seis dicas rápidas para estimular o entrosamento entre jurídico e finanças.
Seja na esfera trabalhista, em decorrência da saída de colaboradores com revisão de estratégia de contratação; na esfera cível, onde se discute falhas de procedimento e quebras de contrato, cria-se a tempestade perfeita para aumento exponencial do número de litígios. E como se preparar diante de um cenário com cada vez mais pressão por controle orçamentário?
A resposta é foco na provisão. Sabe-se que cada empresa possui uma regra específica de provisionamento. Umas associam a decisões favoráveis em primeira instância, outras a teses e jurisprudências do tribunal onde a ação está tramitando. De forma geral, as ações classificadas como risco possível e provável são aquelas provisionadas e informadas mensalmente à contabilidade.
Logo, de acordo com critérios pré-determinados, o jurídico estipula um eventual valor de perda, situação em que a área financeira é alertada sobre o montante que pode ser perdido. Se houver alguma discordância sobre o valor, o juízo ainda determina o depósito, dificultando ainda mais a atualização monetária e o seu correto provisionamento nos controles da empresa.
A atualização monetária dos processos considerando as instâncias e comarcas gera um complicador adicional, sem contar o fato de a ação poder transitar em julgado e ainda constar na lista de provisionamento, impactando desnecessariamente o resultado da empresa. Como demonstrado, a relação entre o provisionamento e o depósito das ações é simbiótica, mas somente por meio de procedimentos e controles claros de rastreabilidade é possível tornar estes assuntos um sinônimo de solução e não de problema.
Para o jurídico, utilizar a tecnologia através de um bom sistema de gerenciamento de ações e análise de dados é essencial. Entender a carteira e acompanhar sua evolução possibilita redesenhar estratégias em tempo real, formular e sugerir políticas de acordos e visualizar analiticamente cada processo através de jurisprudências e teses.
Para finanças, recomenda-se uma provisão cristalina, atualizada constantemente. A provisão é um passivo de prazo ou de valor incerto. Não se sabe quanto uma ação judicial custará e nem quando seu pagamento ocorrerá. Portanto, criar uma base de mensuração para contingenciamento de demandas judiciais relacionada à criticidade de riscos ajuda a saúde financeira da empresa e permite a alocação inteligente de recursos, evitando impacto no resultado e bomba na auditoria.
Pelo viés tributário, a área de finanças, auxiliada pelo setor de LegalOps, pode levar a empresa a aderir a parcelamentos, realizar planejamento tributário e buscar benefícios fiscais. De igual modo, a diminuição de despesas pode servir como estratégia para gerar impacto positivo no caixa a curto prazo e no resultado a longo termo. Provocar as áreas funcionais a ter um controle rígido de orçamento, com justificativas robustas da manutenção da despesa, é um passo importante para controle de gastos.
No jurídico, o suporte na reanálise de contratos permitirá renegociações com base na revisão do escopo contratado. Otimizar as atividades dos fornecedores, aumentar o prazo de pagamento e propor uma nova metrificação de preços com base em entregas concretas e medições de níveis de serviço resgatará a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro entre as partes, dando o fôlego necessário que a organização espera, gerando impacto de caixa a curto prazo. No que se refere aos pagamentos de impostos e a diminuição das despesas, o ganho e o impacto maior é, sem sombra de dúvidas, no resultado.
Para finanças, a atuação dos escritórios precisa ser avaliada sob a perspectiva financeira. Se vencer uma ação, o valor que a empresa deixou de pagar precisa ser levado em consideração como “cost avoidance”, já que tal despesa não será refletida no balanço ou no orçamento. É o resultado de uma equação simples e equilibrada, fruto de um investimento em um parceiro com expertise em determinada área de atuação e de um contrato bem negociado.
No jurídico, é essencial aplicar a inteligência financeira nas negociações contratuais. As cláusulas de êxito, quota litis ou “success fee”, foram suprimidas conforme recomendação de observar as práticas de integridade e compliance, razão pela qual pactuar níveis de serviço atrelados a indicadores consistentes e entregas factíveis pode ser uma alternativa viável para inspirar o parceiro a atingir o resultado esperado.
O investimento nas novas tecnologias para lidar com ações de massa é fundamental aqui. Sistemas com fluxos para otimizar tarefas como tomada de subsídios e aprovações evitam inúmeras trocas de emails e economizam tempo. Entender a correta aplicação de inteligência de dados e de negócios auxilia na mineração da informação e em uma tomada de decisão assertiva.
Ao gerir os escritórios por meio de seus resultados financeiros, é possível ter uma visão mais clara de como os resultados obtidos estão impactando nas estratégias da empresa. Com isso, identificar quais prestadores estão mais alinhados com as metas financeiras e contábeis é necessário, bem como se deve pensar em políticas de remuneração que potencializam tais resultados. Outro ponto importante é controlar as provisões de gastos com honorários e atuar fortemente para que os faturamentos sejam feitos dentro de suas competências, evitando, com isso, que o gasto de um ano passe para o outro.
Ao longo dos anos, para assegurar o pagamento de uma condenação, depósitos são feitos a partir de uma determinação judicial e se acumulam em inúmeras contas correntes abertas pelo Judiciário. Em virtude da mudança de pessoas, sistemas e procedimentos internos, é comum deixar a avaliação de controle de depósito sempre para depois.
Para a área de finanças, tal prática é perigosa. Com possíveis dificuldades de caixa, uma avaliação criteriosa de ações encerradas para a promoção do levantamento de valores pode gerar impacto positivo de caixa.
Para o jurídico, mesmo nas ações judiciais em andamento, pedir ao juízo o levantamento do depósito e sua substituição pela garantia é uma saída possível, a depender da matéria. Por segurança, o pedido de levantamento deve ser feito observando alguns critérios: em ações de natureza tributária com decisões proferidas de forma favorável aos interesses da empresa; demonstração dos motivos do pedido — justificando a melhoria no caixa vis-à-vis a saúde econômica da organização e detalhando as obrigações financeiras em um balanço parcial; apresentação da garantia, seja fiança bancária ou apólice com seguro garantia, atendendo as exigências formuladas em razão da substituição.
Nas palavras do professor Marcelo Guedes, o Judiciário é o hospital da sociedade. Pode-se somar a ele também as plataformas de resolução de conflitos extrajudiciais e avaliações de consumidores. Juntos, eles permitem que a companhia visualize que produtos, serviços ou iniciativas têm sido bem-sucedidos ou não. E por que isso é relevante para a área de LegalOps?
O jurídico, pelas lentes da jurimetria e “legal analytics”, pode apontar para a área de finanças que determinado projeto, a despeito das aparências, representa um efetivo prejuízo. A título de exemplo, imaginem que uma instituição financeira inicia uma captação de novos clientes bem-sucedida, mas que desconsidera regras basilares de proteção de dados e privacidade. Por um prisma, ela conseguiu aumentar a base de usuários em, digamos, 10%. Já por outro ponto de vista, inúmeras ações judiciais e reclamações foram apresentadas por consumidores que se sentiram lesados. Cabe à área de LegalOps, portanto, apertar o botão vermelho e pressionar a área de negócios via finanças.
Contra fatos não há argumentos e contra números não se pode contestar. A inteligência financeira associada à estratégia jurídica permite, sem sombra de dúvidas, alavancar resultados em qualquer organização, independentemente de seu porte. Nas grandes empresas, a sinergia constante entre as áreas, com foco em planejamento estratégico, gestão e alinhamento, acaba por gerar uma oportunidade única, em que instabilidades podem ser atravessadas sem dificuldades financeiras. Basta ter como meta atingir o equilíbrio natural entre o resultado financeiro e o controle de caixa e, para isso, antes de qualquer iniciativa, pergunte-se: impacta no resultado ou no caixa?
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