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Por Carlos Henrique Tranjan Bechara, Marcos de Vicq de Cumptich e João Rafael L. Gandara de Carvalho
O FOT é devido, em regra geral, por todos aqueles contribuintes que usufruem de incentivos fiscais ou financeiros-fiscais editados pelo Estado do Rio de Janeiro e implica um depósito de 10% do valor do incentivo.
Foi publicado ontem o decreto estadual 47.057, de 4 de maio de 2020, que regulamenta o Fundo Orçamentário Temporário (FOT), instituído pela lei 8.645/19, em substituição ao Fundo Estatual de Equilíbrio Fiscal (FEEF).
Como mencionado quando analisamos a lei 8.645/19, o FOT é devido, em regra geral, por todos aqueles contribuintes que usufruem de incentivos fiscais ou financeiros-fiscais editados pelo Estado do Rio de Janeiro e implica um depósito de 10% do valor do incentivo.
A regulamentação, a exemplo do que acontecia com o FEEF, prevê que os benefícios fiscais sujeitos ao FOT são todos aqueles mencionados no Manual de Diferimento, Ampliação de Prazo de Recolhimento, Suspensão e de Incentivos e Benefícios de Natureza Tributária, com algumas exceções pontuais, tais como, benefícios fiscais do setor de comércio e logística (RIOLOG, regulamentado pela lei 4.173/03), dos produtos da cesta básica (lei 4.892/06), da indústria da moda (lei 6.331/12), de cervejas artesanais (lei 6.821/14), da indústria moveleira (lei 6.868/14), dentre outros.
Um ponto que chama atenção foi a previsão na regulamentação de que o FOT não alcança as importações em que não haja a transferência de propriedade. A rigor, como decido pelo STF, não há incidência de ICMS nessas importações. Assim, por não se tratar de benefício fiscal, é claro que o FOT não poderia ser exigido nessas operações. No entanto, o dispositivo parece ter sido incluído justamente para, a contrario sensu, indicar que o FOT incidiria sobre as importações e as demais operações do setor de óleo e gás em que há desoneração do ICMS, por força do convênio 3/18 e do decreto 46.233/18.
Entendemos que há bons argumentos para se questionar essa exigência, seja pelo fato desses benefícios fiscais estarem previstos em convênio interestadual de ICMS, seja pelo fato de se tratar de benefícios fiscais condicionais e com prazo determinado. Além disso, a cobrança do FOT, na prática, pode acabar retirando receitas relevantes do Rio de Janeiro, com a realização dessas operações em outros estados justamente para se evitar o FOT.
O cálculo do FOT, em linhas gerais, é feito subtraindo-se, mensalmente, (I) do valor do ICMS que incidiria normalmente sobre as operações do estabelecimento, sem os benefícios fiscais que não foram expressamente excetuados do FOT; (II) o valor do ICMS resultante da aplicação dos benefícios fiscais. Sobre o saldo resultante dessa operação aritmética é aplicada a alíquota de 10%.
Uma questão relevante é que a regulamentação exige que se desconsidere eventuais saldos credores de períodos anteriores na apuração do FOT. Na prática, essa determinação pode obrigar contribuintes com saldo credor de ICMS a recolherem o FOT, sem respaldo em lei, o que pode vir a ser questionado.
O não recolhimento do FOT leva à imposição de multa e de juros moratórios, além da própria perda do benefício fiscal, no caso de três meses de inadimplência, consecutivos ou não.
Há algumas outras novidades na regulamentação do FOT em relação ao FEEF. Por exemplo, há previsão expressa de depósito extemporâneo do FOT, ainda que, além dos juros, o Estado exija também a multa de mora, inobservando o instituto da denúncia espontânea. Além disso, foi disciplinada a forma de depósito judicial no caso em que decisão judicial que desobriga ao depósito é posteriormente revertida. Nesse caso, nos parece que o Estado deveria se inspirar no legislador Federal, que permite o depósito sem multa de mora no prazo de 30 dias, mas isso não aconteceu e está se exigindo também a multa de mora quando o autor da ação é o próprio contribuinte.
A questão das datas para recolhimento do FOT é também controversa. O Estado do Rio de Janeiro tem entendido, com base em decisão liminar do Órgão Especial do TJ/RJ, que postergou a cobrança do FOT em observância ao princípio da anterioridade tributária nonagesimal, que o FEEF continuou exigível esse ano e só teria sido revogado em 12 de março de 2020. Nessa linha de argumentação, o FOT seria devido apenas a partir do mês de competência de abril, devendo ser pago até o dia 20.05.20.
Contudo, essa não nos parece a melhor posição sobre a matéria. Já há, inclusive, precedentes judiciais entendendo que o respeito ao princípio da anterioridade não se aplica à parte da lei 8.645/19 que revogou o FEEF, de tal sorte que seria indevida a exigência do depósito, quer do FEEF, quer do FOT, nos meses de janeiro a abril de 2020. Entendemos que contribuintes que efetuaram depósitos judiciais a título dessas exações nesse período podem pleitear o levantamento desses montantes, tanto mais no momento atual em que a disponibilidade do caixa das empresas passou a ser tão valorizado.
Diferentemente da lei 7.428/16, que previa a prorrogação do prazo do benefício fiscal para ressarcimento dos valores depositados a título do FEEF, a lei 8.645/19 não prevê qualquer medida compensatória nesse sentido para o FOT. Curiosamente, no entanto, depois de cessada a eficácia do FEEF e embora não haja qualquer previsão em lei nesse sentido, a regulamentação do FOT condiciona o direito à prorrogação previsto na lei 7.428/16 à apresentação de um pedido formal à repartição fiscal da jurisdição do contribuinte até o dia 04.07.20. Ao que parece, o pedido em questão levará a uma auditoria sobre a regularidade do recolhimento do FEEF no período.
Constam também da regulamentação uma série de normas relacionadas a obrigações acessórias, à apuração e ao recolhimento do FOT, que devem ser cuidadosamente observadas para se evitar a aplicação de penalidades ou, no limite, à própria perda do benefício fiscal.
Por fim, entendemos que, além das questões acima mencionadas, há argumentos para se questionar a própria constitucionalidade ou legalidade do FOT, devendo a situação de cada contribuinte ser avaliada de modo específico a fim de se examinar os pontos aplicáveis ao caso.
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*Carlos Henrique Tranjan Bechara é sócio do escritório Pinheiro Neto Advogados.
*Marcos de Vicq de Cumptich é sócio do escritório Pinheiro Neto Advogados.
*João Rafael L. Gandara de Carvalho é associado do escritório Pinheiro Neto Advogados.
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