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Chegado o final do ano de 2017, muitos tem questionado acerca da forma correta de tributar moedas virtuais para prevenir futuros transtornos perante a Receita Federal do Brasil (RFB), mais especificamente no tocante às reservas de Bitcoin ou ao lucro auferido a partir desta criptomoeda. As dúvidas se dão devido às diversas interpretações que surgem da instrução trazida pela RFB desde o ano de 2014. Contudo, antes de ingressar no devido esclarecimento, importante compreender um retrospecto do porquê o Bitcoin vem sendo escopo, diariamente, de notícias e debates.
O Bitcoin, atualmente, é a mais famosa dentre as criptomoedas, o que se reflete no valor alcançado nos últimos meses, tendo atingido o pico histórico de US$ 20.000. Registre-se que já acumula valorização superior a 1.500% desde o início do ano de 2017, quando era cotado abaixo de US$ 1.000.
Lançada em 2009, muito da sua importância se deve ao fato de que ela constitui o primeiro meio de pagamento completamente virtual e descentralizado, o qual jamais sofreu nenhum dano com ataques cibernéticos, conferindo cada vez mais segurança e credibilidade à tecnologia envolvida. Há, contudo, quem identifique o movimento de bolha financeira. Nesta linha, o Vice-Presidente do Banco Central Europeu (BCE), Vitor Constancio, disse, em setembro, que o Bitcoin não é uma moeda, mas uma “tulipa” – em alusão à bolha do século XVII na Holanda.
Instituições internacionais como a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e o Grupo dos 20 (G-20) já apontaram a existência de moedas virtuais como um ponto de atenção. A análise das moedas virtuais foi alocada à Ação 1 do Projeto BEPS (Base Erosion and Profit Shifting), referente aos desafios trazidos pela economia digital e para a Força Tarefa de Ação Financeira (FATF), que determina padrões globais contra a lavagem de dinheiro e o financiamento de ações terroristas.
Importante conceituar, entretanto, que as criptomoedas podem ser compradas de diferentes formas. As exchanges, plataformas que disponibilizam ambiente virtual para intermediação entre vendedores e compradores de criptomoedas, por exemplo, são um dos locais onde se pode adquirir suas reservas.
Saindo das exchanges, há a forma direta que denominou-se P2P (peer-to-peer), onde o vendedor envia a criptomoeda escolhida para o comprador e, este, realiza o pagamento acertado, seja por transferência bancária, depósito, pagamento em espécie ou qualquer outro meio acordado entre as partes.
Atualmente, as criptomoedas movimentam mais de US$ 300 bilhões em transações. Diante desses volumes transacionados e a valorização alcançada ao longo de 2017, aumenta-se o interesse de investidores por essa nova modalidade de ativos e, por conseguinte, a preocupação em se entender, de forma efetiva, como manter a regularidade fiscal/tributária decorrente dos ganhos auferidos com as criptomoedas.
Ora, a definição jurídica do que seria uma criptomoeda – meio de pagamento, bem, direito, ativo financeiro – influi necessariamente sobre a incidência tributária, uma vez que não é dado à lei fiscal alterar conceito da lei civil ou comercial, portanto, esperamos que essa lacuna venha a ser elucidada pelo Poder Legislativo, em especial com os avanços do Projeto de Lei nº 2.303/2015.
Nesse sentido, apesar do BACEN já ter se posicionado de que as moedas virtuais são meios de troca, a RFB as equipara a ativos financeiros, manifestando-se no “Perguntas e Respostas”[1]destinado ao Imposto sobre a Renda de pessoas físicas, em duas respostas aos contribuintes que possuam moedas virtuais.
Se consideradas as criptomoedas como meios de pagamento, sobre elas incidirá o Imposto sobre Operações Financeiras – IOF. Se contudo, consideradas as criptomoedas como bens (asset like values), então, a princípio, deverão ser tributados os ganhos decorrentes da sua alienação pelo Imposto sobre a Renda na modalidade de ganho de capital. Os ganhos da pessoa física são sujeitos a alíquotas progressivas entre 15% a 22,5%, a depender do montante.
Diante da falta de legislação específica, , atualmente, a RFB entende que as criptomoedas devem ser tratadas como bens e tributadas como tal. Eventual modificação desse entendimento – por via legislativa ou administrativa – não poderá retroagir a fatos geradores passados, mercê de disposição do Código Tributário Nacional.
Contudo, essa constatação de que as operações com criptomoedas devem ser tributadas como ganho de capital levantam outros desafios. Desafios ao contribuinte, por um lado, como a devida declaração da propriedade das criptomoedas e de seu valor de aquisição na Declaração de Ajuste Anual, o que pode ser complexo, pois um dos atrativos dessa espécie de ativo tende a ser seu anonimato. Outro problema é a comprovação documental dos valores de aquisição e alienação, que nem sempre pode ser feito por uma nota de negociação, mas apenas por printscreens de telas.
O caráter global e não regulamentado das criptomoedas também pode gerar complexidades quando o contribuinte efetua uma remessa de dinheiro ao exterior para aquisição dos bens. Alguns bancos tendem a promover a retenção de IR nessas remessas muito embora nelas não se configure ganho de capital tributável de residente no exterior.
É o caso, por exemplo, de residente no exterior que tem ganho de capital inferior ao limite de isenção de IR nessa modalidade (atualmente R$ 35.000,00). Em geral, nos acordos contra bitributação que seguem o modelo da OCDE, a jurisdição do adquirente pode tributar a remessa da qual decorra ganho de capital de residente na jurisdição do alienante. Ao fim e ao cabo, competirá ao adquirente brasileiro, para evitar a indevida retenção de IR, comprovar o valor de aquisição pelo alienante estrangeiro e seu valor de alienação para aferir a ocorrência da hipótese de isenção. Tudo isso, ressalte-se, com as dificuldades documentais próprias às criptomoedas.
Também há desafios para a Administração Tributária. Enquanto no caso da maioria dos ativos financeiros a fiscalização pode se dar por intermédio de informações fornecidas por bolsas de valores, mercado de balcão ou corretoras, no caso das criptomoedas há de se considerar a realidade fragmentária das exchanges ou mesmo do mercado P2P, que são realidades completamente alienígenas à vigente regulamentação da RFB. É preciso que se formule uma regulamentação que permita a aferição de valores e operações com transparência, mas sem prejudicar as vantagens tecnológicas desse mercado em formação.
Vê-se, portanto, que embora haja alguma segurança quanto à forma de tributação das criptomoedas, não há de forma alguma um entendimento exaustivo sobre o tema e todas as suas possibilidades. Isso, na verdade, é natural. O Direito, não sendo o Tributário uma exceção, sempre andou a reboque das inovações da economia e da tecnologia. Entretanto, ao contribuinte, é recomendável cautela e assessoria qualificada. Ao Fisco, é imprescindível a compreensão de que a legislação tributária deve viabilizar a arrecadação sem afogar o desenvolvimento econômico e social em burocracia.
Fonte http://www.lexmachinae.com/2017/12/29/criptomoedas-como-tributar/
Por Amanda Lima, Jules Michelet e Rodrigo Borges
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